Prefeita ignora o fato de maior concentração de recursos estar em Brasília
COLUNA DE DOMINGO Na semana passada, o governo Lula anunciou suspensão de recursos do Plano Safra, que financia agricultores em todo o Brasil. Em questão de horas, a prefeita de Canoinhas, Juliana Maciel Hoppe (PL), foi a uma propriedade do interior da cidade criticar o governo por deixar os homens do campo na mão. No dia seguinte, embarcou em um vídeo do governador Jorginho Mello (outro crítico de Lula) para dizer que em Santa Catarina o produtor rural tem direito a um fundo do governo estadual para cobrir perdas com intempéries. “Enquanto o governo Lula descobre se vai suspender o plano safra porque não tinha dinheiro, parece que agora apareceu o dinheiro (…) aqui em Santa Catarina…”, iniciou o vídeo.
Juliana acerta em lustrar as falas de Jorginho, mas erra ao dar sua opinião sobre o governo Lula. Por que é um excelente governo? Não, bem pelo contrário.
Lula é peso morto, está em queda livre nas pesquisas e vem abrindo espaço para a direita emplacar um novo nome (se Bolsonaro seguir inelegível) em 2026. Uma prefeita do Planalto Norte catarinense bater em Lula é chover no molhado. Não muda nada na conjuntura nacional, mas tem seu preço e quem paga são os canoinhenses.
Qualquer prefeito sabe que, goste ou não do governo de turno, precisa ser ao menos cordial. Em Brasília concentra-se a maior fatia dos impostos (60%), é injusto, sabemos. Paulo Guedes foi o único ministro da Economia a falar seriamente sobre redistribuir esses recursos, mas aí veio a pandemia e, cá entre nós, com pandemia ou sem, o Congresso Nacional jamais deixaria os recursos saírem de Brasília para as mãos dos prefeitos, como defendia Guedes. “O prefeito é a pessoa que melhor sabe onde o dinheiro tem de ser aplicado. As pessoas têm uma noção abstrata de Estado e País, mas vivem, de fato, nas cidades”. Enquanto Brasília segue concentrando os recursos públicos, os prefeitos e governadores precisam fazer o beija-mão a deputados, senadores e, se não quiser beijar a mão do presidente, ao menos seja cordial porque na hora de distribuir recursos, isso vai pesar. É injusto, eu sei, mas é assim que a banda toca, seja com direito, esquerda ou centro no poder.
Recentemente o deputado federal Pedro Uczai (PT) esteve em Canoinhas. Não houve agenda com a prefeita. Tampouco os vereadores se interessaram. Como aliado de primeira hora de Lula, Uczai não tem só uma boa fatia do orçamento para destinar aos Municípios, mas tem influência, que como barras de ouro, vale mais do que dinheiro, já vaticinou o finado Silvio Santos, este aliás, aliado de todos os governos, fosse qual fosse.
Quais as chances de parte das emendas de Uczai virem para Canoinhas? Nunca saberemos, porque ninguém tentou. Agora, a informação de que a prefeita grava vídeos criticando Lula e os vereadores são na sua maioria, direita, certamente pousou nos ouvidos do deputado.
Não sugiro que a prefeita mude de posição política. Ela é o que é e foi assim que garantiu duas eleições. Agora, seu projeto de poder é claro: quer ser deputado estadual ano que vem só pra começar e, para tanto, se ancora na agenda bolsonarista. Há de se perguntar se essa agenda é a mais favorável a Canoinhas. Ouso dizer que não. Até que a campanha comece, Juliana tem de colocar Canoinhas em primeiro lugar. Nos governos Lula 1 e 2, a cidade recebeu a unidade do IFSC e a travessia urbana da BR-280, duas obras que transformaram a cidade. Não me recordo de ver Leoberto Weinert, então prefeito da cidade, criticando o governo, por mais que o ex-prefeito demonstrasse claramente reprovar algumas pautas petistas. Pelo contrário, humildemente encomendou um projeto de viabilidade e foi até Brasília defender a necessidade de Canoinhas ter uma unidade do IFSC. Para tanto, não precisou fazer altos elogios a Lula, apenas agradeceu o governo por entender a necessidade da cidade. Justo.
Uczai, o mesmo deputado que teve passagem ignorada por Canoinhas, foi o grande responsável pela travessia urbana da BR-280. Que pleitos Canoinhas poderia contar com o apoio dele neste mandato?
Em tempo: sobre o Plano Safra é necessário contar a história inteira. Lula de fato suspendeu os repasses, mas foi por lentidão do Congresso em aprovar o orçamento para este ano. Trava criada para impedir as pedaladas que levaram Dilma Rousseff ao impeachment foi a responsável pelas suspensão. Lula, então, teve de criar uma medida provisória com validade de 180 dias para liberar R$ 4,1 bilhões aos agricultores. Espera-se que ao fim deste prazo o Congresso aprove o orçamento. Se a prefeita fosse justa, ao menos compartilharia a responsabilidade pela suspensão entre governo e Congresso. Mas está claro que não é este o objetivo dos vídeos.