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Fernando Tokarski: o homem do Contestado

Imagem:Arquivo

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Leia entrevista publicada em 2008 no jornal Correio do Norte

Fernando Tokarski, historiador, professor, escritor, fotógrafo e pesquisador; um misto de atividades que fez dele uma verdadeira autoridade na história da região.

Quem se interessa em pesquisar a história da colonização de Canoinhas e arredores, Guerra do Contestado e evolução socioeconômica da região, sabe que se conversar com Fernando Tokarski, terá um bom começo para seu trabalho. Historiador, professor por profissão, fotógrafo por prazer, escritor por erudição e pesquisador por necessidade, Fernando é uma verdadeira autoridade em história da região, tanto é que é titular da cadeira de História do Contestado na Universidade do Contestado (UnC).

Na entrevista a seguir, Fernando fala sobre Guerra e paz, o futuro da região tomando por referência o passado e satisfaz algumas curiosidades sobre a sociedade canoinhense do início do século 20:

 

O senhor acaba de encerrar uma exposição de fotos sobre Paisagens Rurais. Como foi a repercussão com o público?

Fernando: O público recebeu de forma carinhosa. Percebi que o público gostou da exposição. São paisagens da região, Três Barras, Bela Vista do Toldo, Canoinhas, Porto União. A forma como eu exibi as fotos, utilizando molduras com material reciclável e descartável também chamou a atenção. Não usei nada tradicional. Usei molduras a partir de ferro, pregos, arame farpado, isopor… As molduras remetiam as fotos.

 

 Quando o senhor fez essas fotos, tinha uma noção do que encontraria ou se surpreendeu?

Fernando: Sim, me surpreendi. Nós somos muito acostumados a ver nossas paisagens e achar que são comuns, pobres, e achamos as paisagens litorâneas maravilhosas. Mas aqui nós temos paisagens de uma beleza muito grande, só que nós estamos tão acostumados a valorizar o que é de fora que acabamos esquecendo de nossas paisagens rurais.

 

São oito livros lançados entre autorias e coautorias. A maioria aborda a colonização e as implicações da Guerra do Contestado no final do século 19, início do século 20. Por razões óbvias, o senhor pesquisa muito a colonização polonesa na região. Em que ano os polacos chegaram em Canoinhas?

Fernando: A partir de 1890. Eles já estavam aqui há mais de 25 anos quando a Guerra eclodiu. Eles participaram ativamente da Guerra do Contestado.

 

 O senhor hoje alcançou um grau de conhecimento sobre a Guerra do Contestado admirável. Quais foram as suas fontes para chegar a esse conhecimento?

Fernando: Eu tenho feito, além das leituras, que são incessantes, muita pesquisa em fonte primária, entrevistas. Mas também muita busca em documentos inéditos que tenho conseguido nos últimos tempos e a própria compreensão da realidade local e regional. Muitas vezes, autores não conseguem entender todo o contexto histórico, causas e consequências da Guerra, enquanto que a gente, que é nativo, sempre viveu aqui, tem contato direto com a população, talvez consiga entender melhor todo o contexto da Guerra.

 

Como começou esse gosto por pesquisar o Contestado?

Fernando: Nasci no Timbozinho, hoje interior de Irineópolis, na época interior de Porto União, onde desde criança eu tive contato com pessoas que se envolveram com a Guerra do Contestado. Naquele tempo chamada por todo o mundo de Guerra dos Jagunços. Essas pessoas eram empregados da família Tokarski, clientes, moradores da localidade, enfim, pessoas que viveram a Guerra. E aí, lembro que numa ocasião, o jornal O Estado de S.Paulo publicou uma série de reportagens sobre a Guerra do Contestado. Comecei a ler o jornal e percebi que muitos dos entrevistados eram pessoas que eu conhecia. Foi assim que eu despertei para a pesquisa e aí não parei mais.

 

Como professor de História do Contestado, o senhor prima pela imparcialidade, já que a Guerra do Contestado tem versões tão contraditórias em que os revoltosos são colocados por alguns como jagunços e por outros como heróis?

Fernando: Sempre tenho o cuidado de ensinar evitando ser tendencioso, sempre se preocupando em fazer um trabalho com retorno científico, evitando, inclusive, termos pejorativos como a denominação de fanáticos ou jagunços. Prefiro a denominação revoltosos, porque afinal, eles participaram de uma revolta armada. Nem todos foram jagunços ou fanáticos. A própria denominação Guerra do Contestado é mais abrangente. Uma denominação basicamente acadêmica, porque o nosso povo nunca utilizou esse termo, usavam sim Guerra dos Fanáticos ou dos Jagunços. Preferimos o termo Guerra do Contestado por ser mais abrangente e não ser pejorativo.

 

A briga contra a colonização norte-americana e a disputa por territórios entre Paraná e Santa Catarina foram guerras diferentes?

Claro. A concessão de terras que foi feita pelo Governo republicano a Empresa Brazil Railway que foi a responsável pela construção da estrada de ferro, acabou gerando o que seriam os sem-terras da época. As pessoas que viviam na área de 15 quilômetros para cada lado da ferrovia se viram sem terras. Foram os primeiros insurgentes da Guerra do Contestado. Logo em seguida se instala em Três Barras e Calmon a empresa Lumber, que vai contra os interesses dos ervateiros nativos. Tudo isso gera uma convulsão social aliada a outros fatores como a questão das divisas entre Paraná e Santa Catarina, que acabou gerando a Guerra do Contestado.

 

Qual foi a participação das forças políticas da época na Guerra?

Fernando: Essa é uma questão interessante e de pouco estudo. Canoinhas se envolveu na Guerra por vários motivos, mas uma questão particular foi a de divisas entre Paraná e Santa Catarina. Tivemos aqui alguns líderes da Guerra do Contestado como Antonio Tavares, que veio para a região praticamente a pedido do governo catarinense, assim como veio o Henrique Walland, o alemãozinho. Eles vieram insuflar a população para que eclodisse a Guerra, baseada em fatores políticos. Canoinhas era um reduto dos políticos vidalistas, ligadas ao coronel Vidal Ramos, liderados pelo Major Thomas Vieira na cidade.

Esses políticos, liderados por Antonio Tavares e Henrique Wullens, entraram em divergências com Major Vieira por serem adeptos do Hercilismo, ligado ao governador Hercílio Luz.

 

Major Vieira era um grande defensor da Lumber…

Fernando: Ele ia jogar pôquer com os americanos em Três Barras.

 

 Como o senhor vê a evolução socioeconômica de Canoinhas tomando por base o passado de glória com a revolução cultural promovida pela Lumber ao passo que promoveu a exploração desordenada de nossas riquezas?

Fernando: É inegável que a Lumber contribuiu com nossa cultura. Agora em uma região extrativista como a nossa, acho que vamos viver muito tempo ainda do extrativismo. A nossa dependência econômica de espécies exóticas como o pinus ainda irá durar muito tempo. Isso tem seus pós e seus contras. Se não tivéssemos o plantio de exóticas, o que seria de Canoinhas hoje?. O que precisamos é agregar valores, o que se fala há muitos anos e pouco se pratica em Canoinhas. Agregar valores aos nossos produtos. Temos que deixar de produzir produtos primários com nossa madeira. Isso ajudaria a desenvolver o município economicamente. Historicamente toda a região extrativista é pobre, a nossa não é diferente.

 

 

Na estante

Obras de autoria e coautoria de Fernando Tokarski:

Saparilha (poemas) – 1982

Aniba e outros povos (contos regionalistas) – 1984

Almanaque Polaco (em coautoria) – 1991

Novas informações sobre a família Tokarski (com Ângelo Tokarski) – 1995

Cronografia do Contestado (apontamentos históricos) – 2002

A epopeia do Contestado (em coautoria) – 2002

Mosaicos de Escolas – modos de educação em Santa Catarina na Primeira República (em coautoria) – 2003

Dicionário de Regionalismo do Sertão do Contestado – 2004

Novas visões da Guerra Santa do Contestado (em coautoria)

O Tamboreiro de Pedras Brancas