A iniciativa terá o período de três meses de funcionamento
Zenici Dreher Herbst[1]
Jairo Marchesan[2]
Sandro Luiz Bazzanella[3]
A água é um bem natural fundamental para todas as formas de vida. De acordo com a Lei 9.433/1997, é um bem natural de domínio público, limitado e dotado de valor econômico. Em situações de escassez, o uso prioritário é para o consumo humano e a dessedentação de animais, o que torna este recurso um bem indispensável para a vida em sua totalidade. Ainda, conforme a lei supracitada, a Bacia Hidrográfica é a unidade territorial de estudos, planejamento e gestão dos recursos hídricos. Nesta mesma direção, a gestão deve considerar o uso múltiplo e a descentralização, e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e representantes da sociedade civil – as comunidades (Brasil, 1997).
No âmbito do direito brasileiro inexistem águas privadas, portanto, além de ser um bem e de direito público, é um dos recursos naturais mais importantes para a vida no planeta. A Organização das Nações Unidas (ONU) definiu na Declaração Universal dos Direitos da Água, publicada em 22 de março de 1992, data que se tornou o Dia Mundial da Água, que “a água é a seiva de nosso planeta. Ela é condição essencial de vida de todo vegetal, animal ou ser humano. Sem ela não poderíamos conceber como são a atmosfera, o clima, a vegetação, a cultura ou a agricultura”. Então, cuidar da água é tarefa inadiável e de responsabilidade de todos.
A bacia hidrográfica é a unidade territorial para a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Assegurar à atual e às futuras gerações a disponibilidade de água em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos é um dos objetivos em destaque, e o cuidado é tarefa de toda a sociedade e de todos os segmentos econômicos e produtivos que compõem a comunidade, tais como indústrias, empresas, comércio, agricultura, poder público, dentre outros.
Constata-se, de maneira geral, que os rios – artérias do ambiente e das bacias hidrográficas –, recebem cargas tóxicas, lixos, resíduos e outros. Assim ocorre com o Rio Água Verde, localizado no município de Canoinhas. Percebendo isso, algumas pessoas pensaram em instalar uma ecobarreira, como forma de reduzir a quantidade de lixo no referido rio.
A instalação de uma ecobarreira no Rio Água Verde é um projeto piloto que está sendo realizado em parceria entre a empresa GR Soluções Ambientais[4], a Polícia Militar Ambiental (PMA) e o Instituto do Meio Ambiente (IMA) de Santa Catarina, através da Coordenadoria Regional o Meio Ambiente de Canoinhas, da Prefeitura do Município de Canoinhas e do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Canoinhas e Afluentes do Rio Negro.
Uma ecobarreira refere-se a um dispositivo técnico flutuante instalado em rios, com o objetivo de barrar a condução de lixo, bem como, captá-los e retirá-los dos corpos hídricos para, posteriormente, encaminhá-los ao processo de reciclagem. Ao captar e retirar o lixo dos rios, obtém-se ganhos ambientais, sobretudo na qualidade das águas desses rios. A proposta do Projeto intenciona realizar a retirada de objetos nocivos ao ambiente do rio, tais como plásticos, vidros e outros, especialmente do Rio Água Verde, e sensibilizar e disseminar a conscientização ambiental.
Entende-se por conscientização ambiental conhecer o ambiente físico natural, reconhecendo os bens naturais como elementos públicos, e que, portanto, é dever de todos preservá-los, usá-los parcimoniosamente, destinar adequadamente os rejeitos e lixos (recicláveis), permitir que a natureza possa regenerar-se, não retirando desta mais do que sua capacidade de recomposição natural, dentre outras.
A iniciativa terá o período de três meses de funcionamento. Com isso, será realizado um diagnóstico e a análise do volume de lixo descartado e lançado no rio de forma incorreta pela população. Além do processo de Educação Ambiental, há a pretensão de instalação de ecobarreiras em novos pontos estratégicos, sendo que os resultados serão apresentados à população, para oportunizar reflexão e mudança comportamental.
Trata-se de uma atividade não licenciável, com intervenção e utilização da margem do curso d’água para limpeza. É uma ação considerada de baixo impacto em área de preservação permanente. Um dos resultados esperados é a normalização do fluxo de água do rio e a promoção da conscientização ambiental da população, para que não sejam mais lançados nestes ambientes (margens ou rios) materiais ou produtos prejudiciais.
Para montar a ecobarreira utilizou-se galões de plástico, tela para embalagens, fitas e cordas. O ponto escolhido foi e é de fácil acesso e visibilidade, pois fica em uma área urbana central da cidade de Canoinhas, próximo à ponte que liga o centro a um dos maiores bairros do município, o Campo da Água Verde.
O Rio Água Verde possui sua nascente na comunidade rural do Salto da Água Verde, no município de Canoinhas. Passa pela cidade de Canoinhas e sua foz deságua no Rio Canoinhas, na divisa entre os municípios de Canoinhas e Três Barras.
A retirada manual de entulhos nas primeiras horas de ação resultou em três bags cheios de latinhas, garrafinhas, papelão, plásticos e tecidos, dentre outros, representando a coleta total de 160,1 quilos de resíduos que estavam largados nas proximidades da instalação da ecobarreira.
É importante destacar que a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) foi instituída por lei no Brasil em 2010. Mesmo tendo se passado 15 anos, muitos municípios ainda não organizaram e muito menos implantaram um sistema de coleta de resíduos adequado e eficiente conforme a demanda. Além disso, nem praticaram ações na área de Educação Ambiental, conforme preconiza a Lei 9.795, de 1999. Nesta mesma direção, a Lei nº 12.305/2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, foi regulamentada em 2022, através do Decreto nº 10.936, o qual dispõe sobre a Educação Ambiental na Gestão dos Resíduos Sólidos, enfatizando como objetivo o aprimoramento do conhecimento, dos valores, dos comportamentos e do estilo de vida relacionados à gestão e ao gerenciamento ambientalmente adequado de resíduos sólidos. Temporalmente, portanto, a regulamentação é recente.
Diante das consequências que envolvem as questões ambientais, iniciativas como esta podem ser entendidas como Tecnologias Sociais de Gestão Ambiental (TSGA), visto que são de baixo custo, exequíveis, viáveis economicamente e podem influenciar ou contribuir para a conscientização ambiental. Dito de outro modo, podem contribuir para o processo de sensibilização, reflexão e, quiçá, ações, sendo uma estratégia de transformação social.
Entende-se que as ecobarreiras são ações paliativas, temporárias e até desnecessárias se a população tivesse conhecimento e reconhecimento dos limites da natureza, sensibilidade com o ambiente e Educação Ambiental.
Há pesquisas sobre a importância, bem como, caminhos para se trabalhar as questões ambientais, a exemplo da concepção da Educação Ambiental Dialógica (EAD), que trata a problemática a partir das dimensões que compõe as realidades social, econômica, cultural, científica, tecnológica, ética, espiritual e ecológica, em uma perspectiva de totalidade.
Destarte, há diferença entre debate, discussão e diálogo. É por meio de caminhos metodológicos, sobretudo o diálogo, que se abre a possibilidade de transformação social, inclusive para os problemas ambientais, a partir da compreensão da totalidade. O diálogo é fundamental no processo de Educação Ambiental, pois permite, mediante técnicas e procedimentos metodológicos, demonstrar caminhos possíveis para a autorreflexão e oportunidade de buscar a transformação da realidade, das contradições histórico-culturais vividas através de mudanças de percepções das pessoas com relação ao mundo.
Considera-se que as ecobarreiras e todas as ações ambientais desenvolvidas nesta direção são importantes para a constituição de consciências ambientais, mas sabe-se serem insuficientes. Por isso, a importância de dialogar com a população, promover o debate, buscar meios de comunicação para o repasse de informações e investir na sensibilização e na Educação Ambiental permanente no serviço público, junto às empresas, ao comércio e à comunidade em geral. Dito de outra maneira, o lixo e os resíduos são resultado de atividades humanas e, para isso, é fundamental conhecer e reconhecer as causas e a estrutura societária, por exemplo, o modo de produção capitalista, que estimula continuamente a produtividade, o consumo de produtos e, logo, o descarte. Neste contexto, é preciso diagnosticar as causas dos problemas ambientais, investir intensamente na educação e não apenas tentar resolver paliativamente as consequências. É uma tarefa necessária, urgente, imensa, ampla e contínua, sobretudo de educação.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto nº 10.936, de 12 de janeiro de 2022. Regulamenta a Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 12 jan. 2022. Seção 1, p. 1.
BRASIL. Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 3 ago. 2010. Seção 1, p. 3.
BRASIL. Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997. Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 135, n. 6, p. 470-474, 9 jan. 1997. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9433.htm. Acesso em: 10 abr. 2025.
MACEDO, R. F. de. A água como bem público fundamental: a proteção dos recursos ambientais sob a ótica da legislação brasileira. Jusbrasil. Brasil, 2022. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a-agua-como-bem-publico-fundamental-a-protecao-dos-recursos-ambientais-sob-a-otica-da-legislacao-brasileira/1486311654?msockid=1266a224410d6da808b5b04940db6c4d. Acesso em: 10 abr. 2025.
MONTEIRO, R. de A. A.; SORRENTINO, M. O diálogo na educação ambiental:uma síntese a partir de Martin Buber, David Bohm, William Isaacs e Paulo Freire. Pesquisa em Educação Ambiental, v. 14, n. 1, p. 10-31, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.18675/2177-580X.vol14.n1.p10-31. Acesso em: 24 mar. 2025.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos da Água. Paris, 1992. Disponível em: https://progestao.ana.gov.br/destaques-progestao/semana-da-agua-movimenta-a-agenda-de-recursos-hidricos-nos-estados/onu-declaracao-universal-dos-direitos-da-agua.pdf. Acesso em: 10 abr. 2025.
[1] Pós-graduada em Gestão Pública pela Universidade Federal de Santa Catarina. Discente do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional pela Universidade do Contestado, Santa Catarina, Brasil. E-mail: [email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7819-3143.
[2] Doutor em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina. Docente dos Programas de Mestrado e Doutorado em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado, Santa Catarina, Brasil. E-mail: [email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9346-0185.
[3] Doutor em Ciências Humanas pela Universidade Federal de Santa Catarina. Docente dos Programas de Mestrado e Doutorado em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado, Santa Catarina, Brasil. E-mail: [email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9430-8684.
[4] GR Soluções Ambientais – Empresa privada que atua com tratamento e destinação final de resíduos. Está instalada no Km 238, da Rodovia BR 280, Bairro Pedra Branca, no Município de Canoinhas