Seria o mesmo que não descontar FGTS de empregados
COERÊNCIA
COLUNA DE DOMINGO Um dos poucos argumentos apresentados por vereadores de Canoinhas para sentar em cima do projeto de lei que obriga loteadores a pavimentarem loteamentos antes de os comercializarem é o de que isso eleva o custo para os compradores, inviabilizando a compra, estimulando loteamentos clandestinos e, na hipótese de os compradores se arriscarem, não conseguirem pagar as prestações.
Pois bem, quem é empregador já teve, possivelmente, de explicar para seus funcionários que, todos os meses, o governo abocanha parte do seu salário (8% pra ser mais preciso) e coloca em um cofrinho, o tal FGTS. O trabalhador só pode ter acesso a esse dinheiro, com juros, quando demitido ou em casos excepcionais de calamidades, por exemplo. Pode, inclusive, vejam só, financiar a casa própria usando esse dinheiro de entrada. Há ainda outra fatia do salário do trabalhador que banca seus eventuais gastos com saúde. Essa grana vai para o INSS e garante, ainda, a aposentadoria do trabalhador (embora a conta não feche há um tempo, já que há muitas aposentadorias a se pagar e pouco dinheiro dos trabalhadores na ativa entrando).
Faça uma pesquisa entre os trabalhadores perguntando se eles preferiam receber 100% do salário e dar conta da própria saúde, aposentadoria e eventual desemprego e arrisco dizer que boa parte vai ser a favor. Também não seria surpresa, se isso efetivamente entrasse em vigor, em pouco tempo, termos uma massa de desempregados em absoluta miséria, doentes e sem perspectiva nenhuma de receber uma previdência privada.
Faço essa analogia porque ela cabe como uma luva na questão dos pavimentos. O governo municipal, como escrevi na coluna de domingo passado, não tem dinheiro de receitas próprias para asfaltar nem uma porcentagem ínfima da cidade. Para o pouco que já se pavimentou, os ex-prefeitos emprestaram dinheiro a juros escorchantes. Vai ser assim, agora, com a prefeita Juliana Maciel Hoppe (PL), que anunciou um plano de pavimentação de 14 ruas. Logo, se os loteadores, que sempre serão os que mais ganharão em qualquer circunstância, não pagarem essa conta, não tem quem pague. E é assim que o Município seguirá com déficit enorme de asfaltos em relação a cidades vizinhas do mesmo porte como Mafra e Porto União onde, pasmem, o loteamento pavimentado é lei há anos.
Outro argumento é de que os maiores loteadores podem pagar, os menores, não. Bom, com o preço dos terrenos em Canoinhas, com asfalto ou sem, pelas alturas, quem tem um lote que seja não é baixa renda. Ademais, não estamos falando de um lote, estamos falando de loteamentos com mais de 10 terrenos. Quem tem uma área de terras deste tamanho, parabéns, por mais que você negue e choramingue para vereadores, especialmente sensíveis em ano eleitoral, você é rico. Pertence a um percentual minguado de privilegiados brasileiros.
O que os loteadores querem é maximizar seus ganhos, mandar a conta pela infraestrutura para a prefeitura e se valer dos impostos da população menos privilegiada (a maioria dos canoinhenses) para ficarem ainda mais ricos. Explico: o dinheiro para pagar financiamentos a juros altos não sairá do bolso do prefeito ou prefeita de turno, sairá, claro, do bolso do contribuinte. Curioso que a vereadora Tatiane Carvalho (MDB), defensora dos “pequenos” loteadores, condena os empréstimos e o projeto que onera os loteamentos por causa do asfalto, mas não apresenta alternativa para a incógnita: como pagar pavimentos sem financiamento e sem sequer uma ajuda de quem mais fatura com os loteamentos?
Há, ainda, o bem observado argumento da exigência de pavimento para aquisição de imóvel novo com recursos do FGTS (Minha Casa Minha Vida e Pró-Cotista). A Caixa, sob orientação do Ministério das Cidades, oferece taxas de juros mais baratas, mais acessíveis a pessoas com menor renda, desde que haja o pavimento.
O loteador, claro, sempre vai repassar o custo do asfalto para o comprador. Mas nada mais justo. Quem compra, sabe, terá seu lote supervalorizado pelo asfalto, ainda mais em Canoinhas, onde boa parte da população conhece os dissabores de morar em rua de chão batido. Conhecem ainda melhor quando decidem vender o imóvel.